O objetivo deste resumo é transferir informações de algumas apresentações no Simpósio de Educação Médica (EPM 85 anos). O simpósio foi organizado pelos Profs. Emília Sato (Diretora da EPM e Profa. Titular do Departamento de Medicina – EPM), Rubens Belfort Jr. (Prof. Titular e Chefe do Departamento de Oftalmologia – EPM), Helena
B. Nader (Profa. Titular do Departamento de Bioquímica – EPM e ex- Presidente da SBPC), Arnaldo Lopes Colombo (Prof. Titular do Departamento de Medicina – EPM), Jair Mari (Prof. Titular de Departamento de Psiquiatria – EPM) e Ruth Guinsburg (Profa. Titular do Departamento de Pediatria – EPM). Este resumo representa o entendimento do editor (Mário Junqueira Nóbrega) e pode não corresponder exatamente ao tema apresentado pelo palestrante. O editor declara que não apresenta conflitos de interesse com quaisquer temas ou produtos citados.
I. Abertura e homenagens (Profa. Emília Sato – Diretora da EPM e Profa. Titular de Medicina – EPM)
– Escola Paulista de Medicina (EPM): fundada em 1933 por 31 médicos e 2 engenheiros. Graduou, até os dias atuais, 7.603 médicos; especializou 6.787 residentes e pós-graduou 1.230 mestres e 873 doutores.
– EPM foi responsável por 41,4% da produção científica da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo) entre 2015 e 2018.
– Tendência atual para o aprendizado ativo do estudante de Medicina, em que o professor é um facilitador e os resultados são comuns ao docente e ao aluno.
– Inovação no ensino da Medicina
– Inovação não significa somente alta tecnologia.
– Aprendizado ativo tem maior retenção de conhecimento.
– Universidades públicas: redução nas verbas acarreta dificuldade na aquisição de material de alta tecnologia. Mas pode-se e deve-se mudar a forma de ensinar.
– O ensino não pode ser exclusivamente baseado em casos clínicos construídos ou fictícios. Alunos de Medicina também têm que aprender a olhar nos olhos do paciente, ver a sua linguagem corporal e interagir com o paciente real.
– Boa parte da resposta no tratamento de doenças crônicas depende da relação médico-paciente.
– Importante a construção de confiança e decisão terapêutica compartilhada.
– Futuro do ensino médico: construção de pontes entre áreas da saúde, tecnologia e engenharia.
II. Os 85 anos da EPM e o futuro
– Formação e atitudes do(a) bom(a) professor(a) (Maciel, Saad, Colli – Visão da Coordenação de Saúde FAPESP, 2005) (Prof. Rui Maciel – Prof. Titular de Endocrinologia – EPM)
– Querer aprender sempre: “Aprendi muito com os meus mestres, aprendi mais com meus colegas do que com meus mestres, mas aprendi muito mais com meus alunos do que com todos os demais” (Frase recolha do Talmud 5; 13).
– Gostar de pessoas.
– Aceitar e buscar o feed-back.
– Ter tido vários orientadores e não um único guru.
– Buscar a excelência em sua área de atuação.
– Fazer pesquisa de qualidade.
– Aprender com os fracassos.
– Entusiasmar e dar exemplo aos alunos.
– Ouvir (alunos, pacientes, colegas).
– Ter tempo para pensar.
– Ser humanista e ético.
– Conviver com colegas com valores e cultura semelhantes (para discutir ideias, planejar projetos e expressar frustrações).
– S.T.A.R.T. with Heart (R) (Cortesia Daniella Kerbauy, 2018)
– Smile and greet warmly.
– Tell your name, role and what to expect.
– Active listening and assist.
– Rapport and relationship building.
– Thank the person.
– “Remember that every patient will examine you critically and form an estimate of you by the way in which you conduct yourself at the bedside. Skill and nicety in manipulation, whether in the simple act of feeling the pulse or in the performance of any minor operation will do more towards establishing confidence on you, than a string of diplomas, or the reputation of extensive hospital experience” (William Osler, Can Med J. 1874-75; 3:433-42).
– “Pitting bedside skills against technology creates a false dichotomy. We believe that wedding masterful bedside skills with judicious use of technology will benefit patients most and result in more cost-effective care. Beyond these advantages, the bedside evaluation has therapeutic importance as a ritual that helps to establish a bond between patient and physician” (Verghese e cols. Ann Int Med. 2011;155:550-3).
– Ciência e tecnologia no futuro da Medicina (Profa. Marimélia Porcionatto – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC))
– Ferramentas de análise de big data para prever surtos infecciosos.
– Edição de genes para descobrir novas drogas.
– Tecnologia de captação de atividade cerebral para proporcionar movimento e sensibilidade.
– Estratégias para proporcionar o envelhecimento saudável e aumento da expectativa de vida.
– Biofabricação de tecidos e órgãos para transplante.
– Educando o médico para o futuro (Prof. Artur Beltrame Ribeiro – Prof. Titular de Nefrologia – EPM)
– Acesso à informação: médico precisa ter acesso e saber filtrar a informação.
– Sociedades médicas estão liderando para a formar este filtro e controlar a atividade profissional.
– Médico precisará saber trabalhar em grupo e adaptar-se ao crescimento de outras atividades profissionais.
– Diálogo com as sociedades médicas, visando estabelecer parâmetros, inclusive sobre os custos profissionais (como excesso de solicitação de exames complementares).
– Inserção social do médico: somar ensino, assistência e pesquisa, através de iniciativa pessoal (como parcerias público-privadas).
– Explosão de escolas médicas: haverá desemprego entre médicos; precisarão formação cognitiva para adaptação às novas necessidades, trabalho com diretrizes, controle econômico, critérios de formação das sociedades).
– Benefício gerado pela ciência vai propiciar melhor atividade médica.
– Dependência progressiva que a sociedade (inclusive os médicos) tem da indústria: complicada, mas inexorável. “Não existe medicamento feito pelo governo”.
– Flexibilização do curso médico: atualmente, o curso médico é engessado (pela grade curricular); deixar parte do ensino mais flexibilizada, com aumento de matérias optativas. A especialização precoce ainda é controversa (prós e contras).
– Prof. José Roberto de Brito Jardim (Prof. Titular de Pneumologia – EPM): “aluno é o que o professor quer”.
III. Empatia, compaixão, respeito à diversidade: atitudes que complementam a competência tecnológica. (Prof. Naomar de Almeida Fo. – Instituto de Saúde Coletiva Universidade Federal da Bahia (UFBA); Ex-Reitor da UFBA)
– O médico lida com fatos de duas categorias. As ciências (Química, Física, Biologia) o capacitam a apreender um conjunto; mas ele precisa de um repertório perceptivo e sensível para lidar com os outros elementos (de sua prática), mais sutis. Uma preparação específica nessa direção é muito mais difícil. Para prover esses requisitos de compreensão e empatia, precisamos de uma experiência cultural ampla e variada.
– Reformas instrucionais
1. Adoção de currículos baseados em competências, capazes de mudar rapidamente a fim de atender as necessidades dos sistemas de saúde, em vez de serem definidos por meio de planos de cursos estáticos.
2. Promoção da educação interprofissional e transprofissional, a fim de reduzir o corporativismo profissional e, simultaneamente, reforçar relações de colaboração não-hierárquica em equipes eficazes.
3. As instituições formadoras precisam fazer adaptações necessárias ao aproveitamento de novas formas de aprendizagem transformadora possibilitadas pela revolução da tecnologia de informação.
4. Adaptação de recursos globais para solucionar desafios locais, por meio
do compartilhamento de experiências, currículo, corpo docente, materiais didáticos e mesmo programas de intercâmbio.
5. Mobilização de recursos financeiros e didáticos, incluindo o acesso aberto a periódicos e materiais educativos, mais investimentos na formação de educadores, planos de carreira estáveis e gratificantes, remuneração adequada dos professores e incentivos por bom desempenho.
6. Promoção de um novo profissionalismo, que usa competências como critério objetivo para classificação dos profissionais da saúde, transformando as atuais corporações.
– The devil is in the third year: a longitudinal study of erosion of empathy in medical school. Hojat e cols., Acad Med. 2009; 84:1182-91. Purpose: this longitudinal study was designed to examine changes in medical students’ empathy during medical school and to determine when the most significant changes occur. Conclusions: It’s concluded that a significant decline in empathy occurs during the third year of medical school. It is ironic that the erosion of empathy occurs during a time when the curriculum is shifting toward patient-care activities; this is when empathy is most essential. Implications for retaining and enhancing empathy are discussed (no artigo).
– Prof. Jair Mari (EPM): “alunos entram na faculdade melhores do que saem”. Fatores que contribuem para a desumanização do médico: sobrecarga, depressão, burn-out, precárias condições de trabalho, cobrança de si mesmo, etc…
– Against Empathy: The Case for Rational Compassion. Paul Bloom (Author). Harpercollins, USA. 2016. Empathy is the act of coming to experience the world as you think someone else does.
– Empatia (subjetiva, individual de quem sente) é diferente de compaixão (intersubjetiva, compartilhada, ativa). Empatia cognitiva e emocional: ensinável? transmissível? inspirável? de que modos?.
– Medical students’ exposure to the humanities correlates with positive personal qualities and reduced burn-out: a multi-institutional U.S. survey. Mangione e cols., J Gen Intern Med. 2018; 33(5):628-34. Literature, music, theater, and visual arts play an uncertain and limited role in medical education. One of the arguments often advanced in favor of teaching the humanities refers to their capacity to foster traits that not only improve practice, but might also reduce physician burn-out—an increasing scourge in today’s medicine. Yet, research remains limited.
– Anotações críticas: Empatia promoveria apatia ou omissão? Compaixão (eventual) ou sensibilidade (estado)? Respeito à diversidade implicaria em mera tolerância? Indignação catártica ou solidariedade ativa?
– Pentavium: 5 saberes essenciais
1. Competência linguística: (domínio do vernáculo e de, pelo menos, uma língua franca, definida pela área de atuação profissional).
2. Capacitação em pesquisa (habilidades de raciocínio analítico e interpretabilidade para produzir conhecimentos).
3. Competência pedagógica (habilidades didáticas para compartilhar conhecimentos de modo solidário).
4. Sensibilidade cultural (empatia e capacidade de escuta sensível, com ética e respeito à diversidade humana).
5. Competência tecnológica crítica (compreensão profunda de meios de produções, modos de prática e suas implicações).
IV. Quebras de paradigmas e avanços da indústria farmacêutica; os desafios do passado, presente e tendências do futuro (Prof. Fábio Barros – Químico pela Universidade Federal de São Carlos, SP)
– Thomas Kuhn: “os paradigmas são as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”. Paradigmas se esgotam quando a ciência evolui. Isso acontece durante os antagonismos.
– Indústria farmacêutica segue os paradigmas da ciência; indústria química praticamente dominou a indústria farmacêutica.
– Evolução científica: quebra de paradigmas. A partir da ideia, seguem planejamento, testes não-clínicos, testes clínicos, licenciamento e manufatura do produto.
– Matemáticas – por que contamos? 97 bilhões viveram; 90 bilhões morreram; somos parte dos 7 bilhões vivos; 3 bilhões atualmente vivem com U$ 2,50 por dia (ou menos); somos então parte dos 4 bilhões; menos da metade são financeiramente e fisicamente independentes; portanto, nós na sala somos representativos de cerca de 2 bilhões que têm tempo e condições para fazer a diferença. Então, 2 bilhões em 97 bilhões: somos únicos.
V. Globalização, colaboração e mentoria: os pilares do sucesso na Medicina acadêmica no século XXI (Prof. Renato Delascio Lopes (BR) – Duke University, EUA)
– Duke Clinical Research Institute (DCRI): Missão de desenvolver e dividir conhecimento que melhore o cuidado dos pacientes em todo o mundo através da pesquisa clínica inovadora.
– Desde 2002, o número de investigadores do FDA de fora dos EUA cresceu exponencialmente, numa taxa de 15% anualmente, enquanto o número investigadores dos EUA sofreu declínio de 5,5%.
– Um terço dos ensaios clínicos em fase III das 20 maiores companhias farmacêuticas americanas são realizados, exclusivamente, fora dos EUA. Para estas mesmas firmas, a maioria dos locais de estudo é realizada fora dos EUA (13.521 de 24.206), como Índia, China, Europa Oriental e América do Sul.
– Vantagens da globalização dos ensaios clínicos
– Necessidade de maior tamanho das amostras.
– Melhoria da concorrência.
– Mais pesquisa será realizada.
– Colaboração leva ao compartilhamento do aprendizado.
– Modelos de estudos e de amostras adequadas permitem entender a heterogeneidade genética.
– Globalização: uma necessidade
– Prova dos ensaios de conceito: há diferenças farmacogenômicas.
– Ensaios de eficácia: o contexto da prática clínica faz diferença.
– Ensaios de efetividade: os custos relativos e o balanço dos riscos e benefícios são dependentes do contexto.
– A questão não é se vamos globalizar, e sim porque nós a realizamos, como lidamos com as diferenças culturais e como nós armazenamos e dividimos os resultados.
– Mentoria
– Refere-se à relação de desenvolvimento pessoal na qual uma pessoa mais experiente ajuda a menos experiente. É um processo de transmissão informal de conhecimento, capital social e/ou suporte psicológico que são relevantes para o trabalho, carreira ou desenvolvimento profissional dos menos experientes.
– Qualidades de um mentor bem sucedido
– Muita curiosidade.
– Paixão pela Medicina.
– Acostumado a trabalhar muito e a dormir pouco (
– Muito focado em metas.
– Bom caráter.
– Boa capacidade para amizade.
– Pouco consumo de álcool (ou ausência de consumo).
– Devotado à família.
– Tenha tido bons mentores e bons professores.
– Conselhos para os orientados por mentores
– Não é o que você quer ser, mas como você quer gastar o seu tempo.
– Administre bem o seu tempo.
– Mentores mostram a bússola, não o mapa.
– Mentoria lateral é importante.
– Crie as oportunidades para o mentor ajudá-lo.
– Voar sob o radar não te leva aonde você precisa estar.
– Dicas para os futuros mentores
– Comprometa-se a ser o mentor.
– Seja o mentor e não o tor-mentor.
– Mentoria clínica ou de pesquisa: “não mate o paciente”.
– Cuidado: você é o modelo “por inteiro” (e não apenas no assunto do estudo).